Mais três bairros também registram casos de perda de vacina por medo das facções; Prefeitura não se pronuncia

Após reportagem publicada ontem no Blog Escrivaninha, profissionais de saúde relatam que pelo mais três bairros também registraram casos de pessoas que deixaram de ser imunizadas pelo temor do conflito entre facções.

Por Dayanne Borges e Ricardo Moura

Jovens de pelo menos mais três bairros de Fortaleza, Serrinha, Itaperi e Damas, perderam a vacina contra a Covid-19 por causa do agendamento ter sido marcado para uma unidade de saúde situada em um território dominado por uma facção rival. O medo de que possam ser vítimas de algum tipo de violência no trajeto entre a residência e o posto de vacinação impede que o deslocamento seja feito.

Desde domingo, jovens de 22 a 24 anos passaram a ser imunizados pela Prefeitura de Fortaleza. A redução na faixa etária trouxe consigo uma situação inusitada: os conflitos entre organizações criminais passaram a fazer parte do cotidiano da vacinação. Casos semelhantes já teriam ocorrido com moradores dos bairros do Montese e do São João do Tauape, conforme o Blog Escrivaninha informou ontem, a partir de relato dos próprios profissionais da área da Saúde. Nem mesmo o Centro de Eventos representa um local seguro, haja vista o equipamento público estar instalado em uma área sob a influência dos Guardiões do Estado (GDE).

Na tarde desta sexta, dia 13, a reportagem do blog entrou em contato com algumas unidades de saúde para saber como esse problema vem sendo resolvido. Em uma delas, situada na Secretaria Executiva Regional IV (SER IV), a recomendação é que a pessoa procure uma unidade e exponha a situação de vulnerabilidade à qual está submetida. Seria possível vacinar-se em um local não agendado, portanto, sob a alegação de razões de “segurança pessoal”.

Em uma outra unidade da SER IV, no entanto, a recomendação era a de que a pessoa fizesse contato diretamente com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) para que pudesse receber as devidas instruções sobre como proceder. O que se pode perceber, a partir desses dois exemplos, é que não há um procedimento único para dar conta desses casos.    

Em conversas reservadas, os técnicos questionam a logística empregada para a distribuição dos locais de vacinação. Conforme o Blog apurou, a reclamação é que a estratégia utilizada não leva em consideração as realidades locais, características com as quais os agentes comunitários de saúde, por exemplo, estão mais acostumados a lidar, haja vista estarem presentes de forma recorrente no dia a dia das comunidades.

A reportagem do Blog Escrivaninha entrou em contato com a assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Saúde, por meio de ligações e de e-mails, mas nenhuma resposta foi encaminhada até o fechamento dessa matéria. As perguntas enviadas foram:

“Quantos Jovens já deixaram de se vacinar por conta do conflito das facções? A prefeitura tem conhecimento de pedido de mudança de local de vacinação motivado por riscos causados por facções? Há possibilidade da mudança ser feita? Como ela é feita? Diante dessas ocorrências, a prefeitura pretende acionar os órgãos de segurança e estabelecer protocolos de segurança em algumas unidades?”.

Clima de tensão nas periferias aumentou com o surgimento dos “neutros”

Por dois anos, entre 2017 e 2018, o Comando Vermelho e os Guardiões do Estado travaram uma guerra sem precedentes na disputa por pontos de venda e pelo predomínio sobre comunidades inteiras. O confronto contribuiu para que o Ceará batesse recordes na quantidade de assassinatos. Em 2019, a resposta do Governo do Estado veio com mudanças profundas na gestão do sistema prisional, bem como operações que desarticularam lideranças, em especial da GDE, enfraquecendo a facção. No ano passado, o Comando Vermelho passou a sofrer diversos reveses, tendo como consequência a perda de pontos importantes na geografia do crime.
Diante de um cenário de enfraquecimento das principais organizações criminosas, grupos e comunidades locais buscam sua autonomia. Um salve (mensagem usada pelos grupos para ditarem suas ordens) assinado por membros do CV revelou que eles estavam se desfiliando do grupo e se tornando “neutros”, nome dado a quem não se filia a nenhuma das duas principais facções do Estado. A “neutralidade” vem sendo observada em alguns bairros e territórios de Fortaleza, mas ainda se trata de um processo embrionário na comparação com o alcance territorial das duas principais organizações criminais que atuam no Estado.

Vacinação prossegue no fim de semana

De acordo com a Prefeitura de Fortaleza, a vacinação prossegue neste fim de semana de 14 a 15 de agosto. Cerca de 74 mil pessoas foram agendadas tanto para esta sexta quanto para os próximos dois dias. A primeira dose será ministrada para pessoas nascidas até 2001, bem como a segunda dose e gestantes.
Pessoas que perderam o agendamento da segunda dose ou chegaram à data limite também podem buscar atendimento nessas datas. O Centro de Eventos atenderá de 13 a 15, enquanto os postos de saúde vacinam neste sábado, dia 14.

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