Policial penal afirma que atual sistema prisional cearense está “adoecido”

Em vídeo, profissional relata o cotidiano no interior das unidades prisionais do Ceará a partir do que ocorre na Penitenciária Francisco Hélio Viana de Araújo (Pacatuba). Policial teme retaliações

Por Luiza Vieira, especial para o blog

Em vídeo publicado nesta última quinta-feira, dia 9, Marcos Teles, policial penal da penitenciária de Francisco Hélio Viana de Araújo, no município de Pacatuba, Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), relatou as mudanças ocorridas dentro do sistema prisional nos últimos anos. Com o intuito de fazer com que as gravações chegassem às autoridades responsáveis pelo sistema, o policial gravou dois vídeos explicando as condições de trabalho dentro da unidade.

No vídeo, Marcos admite que a gravação surgiu a partir da necessidade de relatar para quem está de fora os fatos cotidianos que os policiais penais vivenciam. “O sistema está doente, nós estamos doentes. A maioria dos meus amigos toma remédio, eu tomo remédio. Adquiri uma diabetes mellitus tipo 2 muito pelo comportamento, alimentação e principalmente sedentarismo. Mas o que mais tem acabado com a gente é a ansiedade”, pontuou.

Na última terça-feira, 7, um ofício publicado e assinado por Carlos Alexandre Oliveira Leite, coordenador especial da Coordenadoria Especial de Administração Prisional (Coeap) determinou que “os policiais penais efetuem rondas minuciosas a cada hora no interior das alas verificando portas, cadeados e as condições no interior das celas da Unidade”. De acordo com Marcos Teles, a ordem do coordenador causou alvoroço entre os funcionários da Unidade e dos demais sistemas prisionais.

“Na minha Unidade, e nas que a gente tem contato, tá todo mundo doido sabendo como é que vai ser isso aí, de hora em hora dentro das celas, de dia e de noite”, disse. O policial afirma que, no patrulhamento realizado durante as manhãs, não são utilizadas armas letais. No entanto, com o decreto, as rondas noturnas exigem que os agentes utilizem armas com munições letais tais como pistolas e espingarda calibre 12 não letal.

O policial afirma que o secretário da Administração Penitenciária do Estado do Ceará, Mauro Albuquerque, e o coordenador da Coeap, Carlos Alexandre Oliveira Leite, têm cometido erros graves em relação aos direitos dos policiais penais da Unidade.
Marcos Teles explica que um roteador foi instalado na Unidade para facilitar o trabalho dos advogados do sistema, que realizam atividades jurídicas e necessitam da internet. Contudo, alguns “hackers” que cumpriam pena por esse tipo de crime, tiveram acesso à senha proxy- senha do servidor do Estado – viabilizando, dessa forma, o contato com os “parceiros do mundo externo”.

“Foi passado pela direção as pessoas responsáveis pelo ocorrido”, prosseguiu. “O chefe de equipe foi alertado e sabe o que ele fez? Cortou a internet de todos os guardas. Só funciona agora dentro do alojamento. Aí eu passo até três dias dentro da cadeia, sem dados móveis”, pontuou. Marcos Teles acredita que a senha do servidor foi compartilhada para que um interno realizasse o trabalho que, até então, era de responsabilidade da administração.

Além disso, outros benefícios ofertados aos policiais foram suspensos como, por exemplo, o cancelamento de uma oficina mecânica, construída pelos agentes, que permitia que os detentos profissionalizados consertassem os veículos dos policiais. “Esse diretor, o Darcio, por birra, cancelou esse serviço de reparo dos guardas. Só pode o carro dele agora para lavar ou fazer qualquer serviço”, denuncia.

Em novembro de 2021, a Unidade em que Teles atua foi local para um crime de assassinato. De acordo com o policial, um colega de profissão disparou 14 tiros contra um escrivão dentro do e, em seguida, cometeu suicídio. O Blog Escrivaninha abordou o episódio em uma série de reportagens sobre as más condições de trabalho dos policiais penais. Marcos afirma que, passado uma semana do ocorrido, o secretário encaminhou à Assembleia Legislativa do Ceará (ALCE) um documento de regime disciplinar que determina que os agentes que não cumprirem as ordens do sistema terão de ser penalizados.

O policial encaminhou ao deputado Sargento Reginauro (União Brasil) um projeto que prevê uma gratificação para o Grupo de Apoio Penitenciário (GAP) semelhante à remuneração oferecida às demais corporações. “Não custa nada reconhecer o trabalho da gente. Cada um no seu quadrado: a Polícia Militar prende, a Polícia Civil faz o inquérito e manda pra Justiça, mas quem fica com os presos 24 horas por dia somos nós”, expressou.

Quando questionado por Marcos sobre o assunto, o secretário da Administração Penitenciária do Estado do Ceará, Mauro Albuquerque, teria afirmado que solicitou a apuração dos ocorridos e dos benefícios extras. Mauro não comentou sobre esse pedido até a publicação desta matéria.

Novo vídeo

Um dia depois da publicação do primeiro vídeo, Marcos divulgou uma segunda gravação (ver abaixo) em que declara que as modificações no sistema prisional tiveram início no ano de 2019 logo quando Mauro Albuquerque assumiu o posto de secretário da Administração Penitenciária do Estado do Ceará.

O policial afirma que, em meados de 2019, Albuquerque providenciou o fechamento de 134 cadeias públicas do interior do Estado e, em seguida, determinou a depredação das Unidades. “Chegavam caminhões para retirar as grades e os materiais. O intuito era nunca mais utilizá-las. Era um direito da família do preso e do preso estar perto da família para cumprir a pena”. Teles acrescentou que 30 ou 40 unidades estavam preservadas e comparou que, em algumas, “as cadeiras, os monitores e computadores eram melhores que os da Universidade de Fortaleza (Unifor)”.

De acordo com o relato do policial, foi oferecida assistência necessária para que as cadeias não fossem fechadas. No entanto, o secretário e o coordenador teriam desconsiderado o apoio e fechado as Unidades.

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