Por Ricardo Moura
Quando observamos as estatísticas de homicídios no Ceará desde 2013, o gráfico mais se assemelha a uma montanha-russa: aumenta de forma brusca em um ano para cair de modo vertiginoso no outro. Enquanto o ex-secretário da Segurança Pública André Costa esteve no cargo, o Ceará viveu seu ano mais violento e, ao mesmo tempo, os menores índices de assassinatos em uma década.
Fazer com que essa oscilação diminua é uma tarefa para o próximo secretário. Para tanto, é preciso estruturar uma política de segurança pública consistente e que não se deixe guiar por arroubos. Chama menos atenção, rende menos exposição midiática, mas produz resultados mais duradouros.
O sucessor de André Costa, o também delegado federal Sandro Luciano Caron, vem da área da inteligência policial. Trata-se, por certo, de um ponto ainda vulnerável na segurança pública estadual. Profissionais que atuam nos órgãos de segurança queixam-se da incapacidade estatal em identificar e prevenir ameaças, objetivos centrais da atividade de inteligência.
As condições tecnológicas estão postas. O Governo do Estado vem investindo fortemente em recursos capazes de coletar dados e processá-los em alta velocidade, aproximando-se dos limites éticos e morais da invasão à privacidade. Falta, contudo, maior integração entre as polícias e, principalmente, pagar a dívida histórica com a Polícia Civil, corporação sucateada há pelo menos 30 anos.
Urge restabelecer o diálogo com a sociedade civil. As políticas estaduais sofrem de uma concepção autocentrada, isolada e que raramente se volta às demandas das populações mais vulneráveis. É preciso também superar a esquizofrenia de se ter programas similares como as Unidades Integradas de Segurança (Unisegs) e o Programa de Proteção Territorial e Gestão de Riscos (Proteger) operando de forma simultânea.
Como se dá essa costura institucional? Quem é o dono de cada processo? São questões pouco debatidas, mas que precisam ser respondidas e explicitadas caso se queira uma política mais consistente. E, o mais importante, qual dessas iniciativas permanecerá como o legado mais relevante de Camilo Santana na área da segurança pública?
A primeira entrevista do delegado federal Sandro Caron, novo secretário da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), traz em si diversas camadas de interpretação. Embora tenha enfatizado o fato de ser um policial “operacional”, expressão que agrada a tropa pois revela ser um homem conectado ao trabalho das ruas, é possível perceber nas entrelinhas que o grande desafio da pasta é realmente aprimorar suas atividades de inteligência.
O carro-chefe hoje do Governo do Estado na área da segurança pública é o investimento feito em tecnologias de monitoramento e no processamento de informações em quantidades gigantescas (big data). No entanto, essa imensa capacidade de coleta de dados necessita de alguém que saiba projetar tendências e identificar ameaças a partir da leitura dos números, auxiliando a tomada das decisões mais corretas em tempo hábil.
As câmeras de videomonitoramento, por exemplo, têm pouca serventia na identificação de um fenômeno tão complexo quanto a constituição de um movimento organizado de oposição ao governo, como no caso do motim da Polícia Militar ocorrido em fevereiro. Desde o fim do ano passado, mensagens de protesto contra o governador circulavam em grupos de Whatsapp. Já era possível saber, naquele momento, que havia fissuras na adesão da tropa às instâncias superiores. De posse dessa informação, teria sido possível diminuir os danos causados à sociedade? Se sim, o que foi feito?
Coincidência ou não, o novo secretário substituiu o comandante da PM enquanto manteve o delegado-geral da Polícia Civil, um especialista em inteligência policial, no cargo. Retomar a ascendência da corporação é uma tarefa urgente. Sem policiais motivados e proativos, o arcabouço de Inteligência perde boa parte de sua eficácia. Sem informação qualificada, a operacionalidade torna-se um exercício míope. Embora tenha ressaltado a importância dos números, Sandro Caron sabe que os bons resultados de sua pasta dependem necessariamente de uma gestão bem-sucedida do fator humano.
Sobre a imagem. Novo secretário tomou posse nesta última quinta, dia 10 de setembro, em uma cerimônia discreta e limitada pelas novas exigências sanitárias. Foto: Carlos Gibaja / SSPDS.