Por Ricardo Moura
A pouco menos de duas semanas de mais uma rodada de votação, Fortaleza entrou na contagem regressiva para a escolha de seu novo prefeito. Com 35,72% dos votos válidos, Sarto Nogueira (PDT) entra no segundo turno em vantagem diante de seu adversário, Capitão Wagner (Pros), que obteve 33,32%. Embora o medo da violência e o avanço da criminalidade estejam muito presentes nos discursos cotidianos da população fortalezense, o debate sobre o tema pouco avançou no primeiro turno. Os ataques pessoais foram a tônica da campanha, restando muito pouco espaço para se discutir o que havia nos planos de governo. Há quem não goste da comparação, mas em se tratando das propostas para a área de segurança municipal, os dois candidatos possuem mais pontos em comum do que divergências. Basta conferir o que vem sendo proposto e o que vem sendo realizado pela atual gestão.
Uma atualização das torres da Polícia Militar que ornavam Fortaleza nos anos 1990, as torres de vigilância aparecem com destaque no pouco do que conhecemos dos dois planos de governos. Caras e cuja eficiência ainda não resta comprovada, tais equipamentos representam uma concepção ultrapassada de segurança. A noção de vigiar determinados segmentos da população remonta a uma concepção histórica na qual os mais pobres são percebidos como sujeitos perigosos e indomados que devem ser contidos e circunscritos às suas áreas, de preferência longe do olhar das pessoas de bem da cidade.
Não é preciso muita imaginação para saber a quem se destinam os olhares que partem dessas torres. Mais uma vez, a juventude negra e periférica é tratada como se estivesse sempre sob suspeita, na contramão das propostas que visam identificar as potencialidades desse segmento social. Trata-se, como se pode notar, de compreender Fortaleza como uma fortaleza propriamente dita, cujos muros invisíveis não são mais feitos de pedra, mas sim de barreiras eletrônicas.
Estratégia semelhante transparece no esforço da atual gestão, mas que deve ser mantida na que virá, de monitorar os alunos sob a justificativa da prevenção à Covid-19. Milhões de reais prometem ser gastos nessa empreitada, como se o principal problema de nossas escolas fosse o reconhecimento facial de quem ali adentra. Vigilância nas ruas, monitoramento no interior dos espaços públicos. Duas faces de uma mesma moeda ou a mesma face de duas campanhas.
Acenos de melhorias à Guarda Municipal são feitos pelos dois candidatos. Se levarmos as propostas à risca, teremos uma nova sede para o órgão em breve. A militarização crescente da instituição, como se fosse uma mera reprodução da polícia só que em âmbito municipal, parece ser uma tendência irreversível seja lá qual for o nome que vier a ocupar o Paço Municipal em 2021. Como bem afirma o candidato da situação: “Fortaleza tem dado passos para a valorização da Guarda Municipal, com vigilância nos bairros, inovação e prevenção. Roberto Cláudio criou o Programa de Proteção Urbana, contratou mil novos guardas que foram valorizados, treinados e equipados, e atuam como parceiros da Polícia Militar”. O candidato da oposição, por sua vez, defende propostas que muito pouco diferem das do seu adversário, como atesta este trecho de uma sabatina promovida por O POVO:
[Wagner] disse que pretende treinar, equipar e armar os agentes para “defender o cidadão e o patrimônio municipal”. Também afirmou que, além de utilizar a mão de obra dos guardas, é importante investir em tecnologia, como vídeomonitoramento. A ideia é que Fortaleza seja uma cidade mais videomonitorada. É o que chama de “ação preventiva e ostensiva da Guarda Municipal” em seu plano de governo, que também traz outras propostas, como fortalecimento das torres de seguranças (projeto já utilizado pelo atual prefeito) e segurança no ambiente escolar, onde quer promover policiamento preventivo e “ações de educação para a paz social e a prevenção ao uso de drogas”.
Obviamente, há tempo para ajustes e correções de rota. Políticas municipais de prevenção aos homicídios ainda podem vir a constar da pauta eleitoral dos dois adversários. Não é preciso inventar nada, as recomendações do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência estão aí para ser cumpridas. Para tanto, é preciso estar dotado de vontade política e de um olhar que criminalize menos os nossos jovens. Um compromisso real com a defesa da vida dos mais vulneráveis ainda pode estar no centro das preocupações da gestão que virá. Basta querer.
Sobre a imagem. Fortaleza, uma cidade onde telas, redes, grades e câmeras de vigilância já se tornaram parte de sua paisagem urbana. Foto: Ricardo Moura.